1
lume
de secreta e líquida língua
nome
que procura a água de uma boca
ou
um lugar no corpo
que preceda em sede
o amor
: amo esse instante
a brevíssima pausa antes
da nomeação
2
sobretudo e ainda mais
um dia
arrancado palavra a palavra
a este poema
: sobretudo e ainda mais
o segredo de um nome
murmurado gota a gota
entre ti
e a distância
quase imperceptível
entre ti
e mim
sobretudo.
e ainda mais,
amor.
3
em dias como este
lentos
lisos
brancos e quentes
pela chaminé de casa sai um sussurro
um restolhar brando
quase de pássaros
quase de árvores
quase de flor
: cá dentro
o meu anjo
despe as suas asas
e um vento brisa se alevanta
nas planuras do meu ventre
a tua voz o riso manso dos teus olhos
os teus beijos de plumas e de sossego
crescem em mim como mãos
: no fundo que me é terra
filhos raízes desbravam-me os nomes
e copas cópulas de sol
e mar de marés
vêm ver morrer devagar
toda a água da boca
na praia dourada do corpo
(sob a tua língua
amado
eu escrevo vales
concâvos desejos
ou
promontórios de luas e pequenos segredos)
4
quando em abraços por fim
nos caímos
um do outro por fim
saciados
descem por meus olhos os ténues fios
que te hão-de crescer
em novas sedes
em novas águas
e tu
devagarzinho me alisas
a curva mansa destas lágrimas
com abraços longos
beijos e murmúrios apertados entre a carne
como a terra dá ao mar em dias assim
parados
muito parados
quase imóveis
5
não sei de hora mais hora em mim que possa
com o ir
e vir das horas e das marés
ser mais mar
mais outra coisa
que o amor em refluxos
de sal e onda
que o amar-te por sobre o dia
e por sobre o tempo do dia
que olhar o infinito do ir e vir
aqui
perante as ondas
perante o mar
e descobrir que sobram sempre
mais dois
mais dois
mais dois de sal e de marés
mais dois de sal e de marés
e de tempo que se desfaz noutra e ainda
mesma coisa
como areia da praia toda líquida
ou água de mar toda verde
que esconde em si todo o sol
e todo o azul
de céu
infinito
: não sei de outra coisa
amor,
que amar o mar e o amor
amar-te no mar
deste amor
e assim erguer o meu corpo
perante o dia
blimunda dixit
06 agosto 2006
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