27 março 2006

22. n.



não mudou nada. nem as folhas que jaziam. sobre a jarra. dentro da árvore. nem a água. dentro da terra. se escapou para o mar. nem o azul dourado amanheceu e fez o dia. nem a escuridão fez a noite como antes. quando ainda dormíamos. repito. quando ainda dormíamos. repetindo. contando as vezes que roubávamos ar. ao ar. repetindo. ar. ao ar.

se te contar. que já escrevi sobre este mundo. e não encontrei. uma única pedra para atirar. os braços mentiam ao corpo o movimento. e só me saía fuligem pelos olhos. ao alvo morto ao longe. e não soube o nome de ninguém. e não cheirei nenhuma flor. e não provei o sal. nem sei ao que sabe. e não beijei nenhuma mão. árida e seca. e não sei o que é ser. árido e seco. e penso e julgo. que ser árido e seco. é ter uma vida. virada para dentro. e ali. no dentro. tudo se consome. o ar. a terra. o amor. e a saudade.

se te contar. que não mudou nada. que os cães ainda andam soltos. a morder as pernas de quem quer andar. que a poeira se agarra ao rosto. e com o suor. se transforma noutro rosto. e nos engole. que as mãos que transformam a terra. em tudo. estão cansadas. e sós. e à tua espera.

e não mudou. nada. se o nada não é tudo e se o tudo. é nunca.

nunca é nada.

n. de nada.



joão dixit

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