10 fevereiro 2006

14. lua cheia


Cansara de aguardar. Um dia atrás do outro. Um de riachos de água a desentupir sujeiras. Em outro, brasas de lume sobre a terra e nem maior se daria a secura...esta e o odor...aquele dançar de partículas de coisa que já fora.

Cansara. De Junhos e Setembros. Também dos que lhes ficavam, antes, depois e no entre. Aguardar é demais que espera. De espera a gente sabe que aquilo chega. De aguardar a gente nunca sabe. Até se dá em deslembrar . Fica só entalado num desvio da memória.

Ele cansara disso.

Num dos Dezembros, o pai morrera.

Não chorara. Não lhe entendeu aquilo na cara choro. Estranhara só.

Uma noite de um desses meses...puxaria a camisola para o pescoço. Abotoaria o éclair das de ganga. No bolso a carteira documentos notas. Aos pés da cama deixaria um cartão...pedaço de uma oferta de um Dezembro. Escreveria fui. Em letras garrafais. Ninguém que visse se deslembraria. Ficaria antes correndo. Procurando. Ele já iria em outro Junho. Nem seria já ele. Ele descambado de aguardar. Ele cumprimentado daqueles que passavam. Ele sempre quieto. Sentado na soleira da porta...arrimado ao pé do limoeiro. Arrumando sonhos.

Partiria.

Puxou a camisola para o pescoço.... apanhou um limão.

A lua rebentava de brilhos de cheia. Pisou a soleira. Entrou. A luz da lua estendia um lençol sobre a cama.

No mês de dois seguintes o limão mirrara. Na cama outro lençol de lua.

Ele já não era ele. Dizia assim quem o cumprimentara cansado de aguardar.... Diziam...num mês depois de dois...cuidaram que partira...ele apenas cansara. Cansara de aguardar.

Um dia atrás do outro...cansara.

Dormitório III, Vincent Van Gogh



Seila dixit

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